Missas em Roma, do Prelado e do Vigário Auxiliar

Disponibiliza-se a homilia do Prelado do Opus Dei pronunciada na Basílica de Santo Eugénio (Roma), por ocasião da festa de S. Josemaría Escrivá. Disponibilizam-se também alguns excertos da homilia que, pela mesma ocasião, fez o vigário auxiliar, Mons. Fernando Ocáriz.

Homilia na celebração litúrgica de S. Josemaría

D. Javier Echevarría, Prelado do Opus Dei

Roma, Basílica de Santo Eugénio, 25-VI-2016

Seja louvado Nosso Senhor Jesus Cristo.

Queridos irmãos e irmãs:

Não podemos deixar de nos maravilhar e de nos encher de agradecimento perante o diálogo entre Jesus e Pedro que o Evangelho recolhe. Depois de ter utilizado a sua pobre barca, o Senhor convida Simão a ir mar adentro para a pesca e acompanha-o. Sabe que esse homem é um exímio pescador e que por isso lhe diz, com grande simplicidade e confiança, que não pescaram nada durante toda a noite.

Pedro pergunta-se como é possível que a sua sorte mude, agora que se fez dia. Mesmo assim, confiando em quem o aconselha, faz o que Jesus lhe pede e lança as redes. A extraordinária fecundidade daquela pesca move Pedro a pôr-se de joelhos. E Cristo responde-lhe com um dom ainda maior: anuncia-lhe que, a partir daquele momento, ele e os seus companheiros serão pescadores de homens.

Neste Ano Jubilar da Misericórdia vemos, neste gesto do Senhor, uma demonstração mais da misericórdia divina. Jesus tem pena desses pescadores que não conseguiram nenhum fruto do trabalho do qual têm que viver. Mas respeita a sua liberdade e, em vez de levar Ele a cabo um milagre deixando-os de boca aberta mas sem nada terem feito, sugere-lhes que lancem uma vez mais as redes. Deste modo são eles, os próprios apóstolos, que conseguem “uma grande quantidade de peixes”, tão grande que até “quase se rompiam as redes”. É lógico! Precisamente porque o Senhor teve compaixão, a sua compreensão suscita neles uma fé tão grande que se torna palpável; o Mestre não ignora a sua capacidade de trabalho, de empenhamento, de crescer esforçando-se juntos.

Podemos afirmar que a misericórdia de Deus, que Cristo trouxe à Terra, dá asas à liberdade humana. Que maravilha! Deus deixa-nos fazer, deseja que demos a nossa contribuição. Conta com o profissionalismo de cada um: pescadores, professores, pedreiros, artesãos, funcionários..., e tantos outros. Cada um de nós ‒ médicos, pessoal de saúde, jornalistas…, jovens e idosos … ‒ pode encontrar aqui uma lição que S. Josemaría propõe, quando comentava assim o convite do Senhor: “Ao largo! — Repele o pessimismo que te torna cobarde” (Caminho, n. 792). A todos, a cada um, convém-nos não apenas receber, mas dar, mais ainda, dar-nos, entregar-nos para chegarmos a ser dignos de escutar a chamada do Senhor: “Não temas, a partir de agora serás pescador de homens”.

Nesse entregar a vida por dar a conhecer e amar Jesus – pois nisso consiste o ser pescador de homens – encontramos a nossa verdadeira dignidade. Como ensina o Concílio Vaticano II, o homem “não pode encontrar a sua própria plenitude se não for na entrega sincera de si mesmo aos outros” (Gaudium et Spes, 24).

Mas voltemos ao Evangelho. Contemplámos como o Senhor levou Pedro a uma verdade mais elevada: da eficácia material de uma pesca para a fecundidade do apostolado.

“Afasta-Te de mim ‒ exclama Pedro, ainda na barca ‒ porque sou um pecador”. Também nós, como Pedro, nos reconhecemos pecadores. E ao mesmo tempo também nós, como Jesus, encontramos na vida pessoas que inexplicavelmente foram afastadas, marginalizadas, rejeitadas, e a quem o sofrimento levou a encerrarem-se na sua própria miséria e solidão.

S. Josemaría compreendeu desde a sua juventude esta realidade, e movido pela sua sensibilidade de pastor, foi visitar os doentes, abandonados de todos, nos hospitais ou em suas casas, deslocando-se com frequência às periferias de Madrid.

O Papa Francisco, na carta que escreveu com motivo da beatificação do meu predecessor, fez menção dessa predisposição para sair ao encontro de todos, que ele descobria também no Beato Álvaro: também ele, disse o Papa, “ia aos bairros para ajudar na formação humana e cristã de tantas pessoas necessitadas” (Carta, 26-VI-2014).

Ao longo da sua vida ‒ afirmou S. João Paulo II ‒ S. Josemaría, “santo de grande humanidade (...), impulsionou tantas obras de evangelização e de promoção humana a favor dos mais pobres” (Discurso, 7-X-2002). E hoje, seguindo também o exemplo pessoal do Papa e acolhendo com alegria o seu convite para “anunciar a misericórdia de Deus” (Misericordiae vultus, 11-IV-2015), desejaria animar todos os fiéis e amigos da Prelatura a seguir – como graças a Deus já fazem – este caminho aberto por Cristo e tão amado pelos santos: servir os outros, ajudá-los nas suas necessidades, sair de si mesmos, ir como Cristo “mar adentro” e acompanhá-l’O ali onde tantas pessoas, talvez sem o saberem, nos esperam.

Também nós, como Cristo com Pedro, podemos gerar nos outros a surpresa que cada um experimenta quando encontra compreensão, ânimo e ajuda espiritual ou material. E, como Pedro, podemos apoiar-nos na nossa profissão de fé diária ou no nosso trabalho para estender a misericórdia de Deus: o professor fá-lo-á quando ensina a quem não sabe; o médico, quando cura os doentes com delicadeza; o juiz, se trabalha com séria dedicação; o cozinheiro, quando prepara comida para quem tem fome... Também na maravilhosa “profissão” de ser pais: vós, pais e mães de família, sois testemunhas de misericórdia em cada instante do vosso dia, de manhã à noite, sem pausas, ajudando-vos mutuamente e educando os vossos filhos na alegria do amor. Como disse o Papa Francisco, “as obras de misericórdia são infinitas, cada uma com o seu selo pessoal, com a história de cada rosto” (Meditação, 2-VI-2016).

Por último, podemos dizer com S. Josemaría que a existência do cristão se desenvolve no clima da misericórdia de Deus. “Esse é o âmbito do seu esforço, por se comportar como filho do Pai” (Cristo que passa, 8). Dar-te-ei em propriedade […] os confins da terra, canta o Salmo 2: sim, o Senhor dá-nos a terra em herança para que levemos a todo o mundo, precisamente, a surpresa, o amor e a alegria dos filhos de Deus.

Que Nossa Senhora, Mãe de Misericórdia, nos dê um coração misericordioso para amar os outros como filhos de Deus e, deste modo, amar a alegria de nos pormos ao seu serviço.

Seja louvado Nosso Senhor Jesus Cristo.

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Mons. Ocáriz: "Deus e os outros: são estes os grandes horizontes da nossa vida"

(Excertos de uma homilia pronunciada na Paróquia de S. Josemaría, Roma, em 26 de junho de 2016)

Somos todos parte de una grande aventura apostólica. No Evangelho que acabámos de ler, Jesus envolve numerosas pessoas na sua tarefa de ensinar o caminho para a verdadeira felicidade. Eram tantas as pessoas que se reuniam à Sua volta, que Jesus pede a Simão que o deixe subir à barca. No final da pregação, o Senhor propõe um desafio ao pescador: "Rema mar adentro e lança as redes para a pesca"; rema mar adentro, duc in altum! Estas palavras tiveram um grande impacto no coração de S. Josemaría, e transformaram-se num eco que escutou durante toda a sua existência. Duc in altum!

S. Josemaría repetiu, por seu lado, numerosas vezes esta indicação do Senhor a muitos cristãos, para que não se conformassem com ter um convívio superficial com Deus, para que não caíssem na tentação de se fecharem em si mesmos. "Fazei-vos ao largo e lançai as vossas redes para pescar. Este zelo apostólico que Cristo infundiu no nosso coração não se deve esgotar – extinguir – por uma falsa humildade. (…) Manda-nos que lutemos, que reconheçamos os nossos defeitos; não para nos acobardarmos, mas para nos arrependermos e fomentarmos o desejo de sermos melhores." (Cristo que passa, 159)".

Deus e os outros: estes são os grandes horizontes da nossa vida. Ir ao encontro de Deus, que é nosso Pai e dos outros, que são nossos irmãos (...). O Senhor chama-nos a metermo-nos nesse mar de amor infinito que é Ele, a deixarmo-nos guiar pelo Espírito Santo, como diz São Paulo, para poder ter uma conversa de filhos com o Pai.

Submerjamo-nos, portanto, nesse oceano de paz e amor que é Deus, na nossa oração quotidiana, nesses espaços de silêncio e de oração íntima que podemos encontrar – obviamente, pondo um pouco de empenho – no meio das ocupações de cada dia. Descobriremos que o Senhor está sempre ao nosso lado, também quando parece que os nossos dias terminam com as redes vazias, como sucedeu a Pedro no dia em que encontrou o Mestre junto ao lago de Genesaret.