80 anos depois da primeira romaria

S. Josemaria fez a sua primeira romaria a 2 de Maio de 1935. Nesse dia, foi rezar à ermida de Nossa Senhora de Sonsoles (Ávila, Espanha) acompanhado por Ricardo Fernández Vallespín e José Maria Barredo. Neste artigo, recuperamos algumas notas sobre essa primeira romaria.

“Vem-me agora à memória uma romaria que fiz em 1935 a uma ermida da Virgem em terra castelhana - a Sonsoles.
Não era uma romaria no sentido habitual. Não era ruidosa nem multitudinária. Íamos apenas três. Respeito e estimo essas outras manifestações públicas de piedade, mas, pessoalmente, prefiro tentar oferecer a Maria o mesmo carinho e o mesmo entusiasmo por meio de visitas pessoais, ou em pequenos grupos, com intimidade.
Naquela romaria a Sonsoles, conheci a origem desta invocação da Virgem - pormenor sem grande importância, mas que é uma manifestação filial da gente daquela terra. A imagem de Nossa Senhora que se venera naquele lugar esteve escondida durante algum tempo, na época das lutas entre cristãos e muçulmanos em Espanha. Ao cabo de alguns anos, a imagem foi encontrada por uns pastores, que, segundo conta a tradição, exclamaram, ao vê-la: Que lindos olhos! São sóis!" (Cristo que passa, 139).
Em 1935, a devoção à Santíssima Virgem tinha lugar cimeiro no plano de vida espiritual que S. Josemaria Escrivá delineara para os membros do Opus Dei. Previa a recitação diária (…) do Rosário, do Angelus e outras práticas de devoção mariana. Escrivá sentiu ainda a necessidade de manifestar de um modo concreto a devoção a Nossa Senhora durante o mês de Maio que lhe é dedicado tradicionalmente na Igreja. Encontrou a solução baseando-se num caso sucedido na vida do Opus Dei.
Ricardo Fernández Vallespín contou a Josemaria Escrivá que durante o Verão de 1933 um ataque de reumatismo esteve a ponto de o impedir de terminar o projecto que tinha de apresentar para terminar o curso de Arquitectura. Se não o entregasse a tempo perderia o ano. Tinha rezado a Nossa Senhora e prometera-lhe que, se conseguisse completar o projecto satisfatoriamente, faria uma romaria ao Santuário de Sonsoles, situado nos arredores de Ávila. Tinha conseguido apresentá-lo antes de pedir a admissão no Opus Dei, mas não cumprira ainda a promessa. Josemaria Escrivá ofereceu-se para o acompanhar, não numa romaria pública, mas num grupo de três formado por eles e José Maria Barredo.
No dia 2 de Maio de 1935 tomaram o comboio de Madrid para Ávila e depois percorreram a pé os quatro quilómetros até ao santuário. Rezaram cinco mistérios do Rosário durante o caminho. O santuário via-se ao longe, no alto de uma pequena colina. Em dado momento, contudo, perderam-no de vista por uns instantes. Escrivá converteu este pequeno episódio numa parábola da vida espiritual: “Assim faz Deus connosco muitas vezes. Mostra-nos claramente o fim e dá-no-lo a contemplar, para nos firmar no caminho da sua amabilíssima Vontade. E, quando já estamos perto de'Ele, deixa-nos nas trevas, parecendo abandonar-nos. É a hora da tentação: dúvidas, lutas, escuridão, cansaço, desejo de nos sentarmos à beira do caminho… Mas não: adiante. A hora da tentação é também a hora da Fé e do abandono filial no Pai-Deus. Fora com as dúvidas, as vacilações e as indecisões! Vi o caminho, empreendi-o e sigo-o".
No santuário rezaram outros cinco mistérios do Rosário, e os cinco últimos no trajecto de regresso à estação do comboio. O caminho levou-os por campos de trigo maduro. Escrivá colheu uma poucas de espigas de trigo. “Veio então à minha memória um texto do Evangelho, umas palavras que Nosso Senhor dirigiu ao grupo dos discípulos: 'Não dizeis vós que ainda há quatro meses até à ceifa? Pois eu digo-vos: Levantai os olhos e vede os campos que já estão brancos para a ceifa' (Jo IV, 35). Pensei uma vez mais que o Senhor queria meter nos nossos corações o mesmo desejo, o mesmo fogo que dominava o seu".
No regresso de Sonsoles, Josemaria Escrivá estabeleceu o costume de que todos os anos os fiéis do Opus Dei honrassem a Virgem Maria desta maneira no mês de Maio: com uma romaria simples e penitente, feita num pequeno grupo, com o fim de ajudar todos a terem mais devoção a Nossa Senhora.
John F. Coverdale, A fundação do Opus Dei, p. 162-163